Formas e formas de se dizer algo...
Ele chegou em casa cansado, nem bem rodou a maçaneta pra entrar já estava tirando a gravata, desabotoando a camisa e jogando a mala em cima do sofá. Foi andando em direção a cozinha, vinha um cheiro ótimo lá de dentro. Em cima da mesa, arroz com cenoura, frango de panela e farofa com torresmo, tudo do jeitinho que ele gostava, pensou se estaria esquecendo uma data importante, seria aniversário de casamento? Ta certo que a mulher era caprichosa, mas em plena segunda-feira um jantar assim? Só podia ser data importante, sentou na cabeceira da mesa e pensou, pensou, pensou e desistiu, desemborcou o prato e começou a comer. No que olhou pra frente, viu encostado na jarra de suco de caju um envelope, encheu a boca com uma colherada e enquanto mastigava foi abrindo pra ler o conteúdo.
“Oi, não se preocupe, sei como você é, deve estar se sentindo culpado por não lembrar da data, mas isso não é pelo nosso aniversário de “primeiro encontro” hoje é dia 4, nos conhecemos num dia 12 e casamos num dia 12 pra não esquecer data, lembra? Hoje na verdade é um dia especial, só isso, só, foi assim que me senti a maioria das vezes, relaxa, a culpa não é sua...”
Ele engoliu seco o bolo de comida que tinha, deu uma boa golada no suco de caju e como quem lê o jornal no café da manhã, resolveu continuar fazendo as duas coisas, comendo e lendo.
“...eu sempre me senti assim, desde pequena tenho isso comigo, de ser só, acho que era de tanto minha mãe falar que eu tinha nascido sozinha, por isso ia morrer sozinha. Mas essa solidão, ocupava um espaço muito grande, achei que você, suas roupas pra lavar, seu almoço, seu jantar, seus botões soltos da camisa, suas histórias e estórias de trabalho, seu corpo, seu sexo, suas incompreensões, seu sorriso tudo isso pudesse de alguma forma preencher esse vazio, terrível engano...”
Nesse momento ele já começou a chorar, empurrou o prato pra longe, botou a mão na cabeça e começou a olhar para um lado e para outro, procurando a materialização de Elizabeth naquele exato momento na cozinha, mas ainda sim, resolveu continuar lendo.
“...Mas hoje, pela primeira vez na minha vida, não me senti só, sei que não estou só, algo começou a crescer aqui dentro, me fez repensar minha forma de ver a vida, me fez querer ser alguém diferente, e é por conta disso que tu estás ganhando esse jantar especial. Recebi o resultado do teste de gravidez, parabéns, você será papai!”
Ele respirou fundo, olhou atrás da carta e leu bem grande ESTOU NO QUARTO , enfiou uma colher de farofa na boca e saiu correndo até lá.
Quer, quer, não quer? não te quero!
P.Siu1: A internet está boicotando a S&R letras, ô saudade da máquina de escrever, ô saudade da época que não éramos fibra-ótica-dependentes!
P.Siu2: Obrigada, por não deixar que o tempo acabe com a curiosidade que temos um pelo outro, enquanto tiver interesse, ainda vai valer a pena.
P.Siu3:Trilha do post? Joãozinho - Vanessa da Mata (primeiro lugar no top 10 da parada de sucessos pra fazer a Aimee dormir)
posted by Sic @ 5:19 AM
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