A mosca que não pousou na sopa de Clarice

Eu estava em volta das quatro paredes a observando, elegante por natureza, nunca descia daquele salto imaginário. Já tinha posto os filhos pra dormir, adorava fazer isso, depois de tanto tempo entre os seus arredores tenho certeza, era a coisa que mais gostava de fazer, cuidar dos filhos, depois disso, o deboche era sua prática preferida.
Quantas vezes a vi sentar delicadamente no sofá, máquina de escrever no colo, cigarro na mão eseus dedos frenéticos entre as teclas com velocidade e ritmo, parava um pouco, tragava, ria, continuava. No final da página, sempre uma gargalhada, do tipo deusa do cinema, em preto e branco usando Dior. E Eu? ficava ali no canto, vendo essa repetição: levanta, bebe alguma coisa, volta, escreve e ri.
Um dia ela não agüentou, estava sozinha, já era tarde e acho que resolveu falar, mal sabia que eu estava ali, no cantinho da sala, pregada no teto como sempre, admirando aquela mulher, ouvi uma vez alguém falar que a gente morre e volta outra coisa, eu adorei isso, e da próxima vez, vou ser ela.
Suas frases eram pausadas, voz baixa, rouca. Cheguei mais perto pra escutar tudo, não muito, o suficiente para não incomodar, exatamente na fronteira entre os nossos mundos, ela não permitiria que avançasse além desses limites, nem eu, nem ninguém. Então ouvi entre uma gargalhada e outra algo como:
___ Imagino a cara deles tentando dar um início, um meio e o fim pra tudo isso. Gargalhadas. Adoro saber que as pessoas acham que tudo é repleto de subjetividade. Gargalhadas. Ah! se eles soubessem que escrevo pra me manter viva, porque a risada é o combustível da alma e cada vez que escrevo essas coisas e imagino o quanto de tempo eles perdem fingindo entender não tenho como manter a seriedade. Gargalhadas, gargalhadas e mais gargalhadas.
Era isso, o resumo era tão simples ela era uma mulher inteligente o suficiente pra descobrir uma nova forma de se divertir, o deboche dos intelectuais, essa era a sua prática esportiva. Mas óbvio, não conseguiria fazer as coisas como qualquer mortal, ela não era qualquer mortal, era minha representação de perfeição, linda, profunda, elegante e mãe dedicada. A única coisa que me deixa puta, é que fiquei anos a observando no canto da sala, estudei cada movimento dessa criatura brilhante, e no final das contas essa vaca escreve um livro inteiro sobre o encontro dela com uma barata!
Texto da Semana
A arte é só a forma em movimento.
P.Siu1: PRÓXIMO POST SÓ EM SETEMBRO! Vou viajar a trabalho e ficarei todo esse tempo longe, o que eu vou fazer? Mapear o Paleozóico no noroeste do estado do Pará, ou seja, procurar pedra velha lá onde judas perdeu as botas.
P.Siu2: Bem, a teoria de que a Clarice Lispector não passa de uma debochada não é minha, é do Alê kkkkkkkkkk Ele sempre solta uma pérola que é “Eu só gosto da Clarice Lispector filtrada pelos teus olhos, acho que ela era mulher inteligentíssima e super debochada, escrevia coisas sem pé nem cabeça de propósito”. Eu não concordo com ele, mas enfim, sabemos porque, ele é realista e eu modernista, paciência e viva a diferença!
P.Siu3: Campanha auto-estima esperança, doe um elogio, declarações de amor e saudade pra essa que vos escreve e assim quando eu voltar vou me sentir uma pessoa infinitamente melhor do que sou. Ah! e vocês ainda podem descontar isso como contribuição no imposto de renda divino, pros que acreditam, pros que não acreditam eu pago com comida.
P.Siu4: Vou morrer de saudades, da minha casa, dos meus filhos (nunca ficamos tanto tempo longe), do meu marido (esse sempre me abandona kkkkkkk) e dos meus amigos (eles me abandonam eventualmente kkkkkkkk). DRAAAAAAAAAMA.
P.Siu5: Trilha do post? Girlfriend – Avril Lavigne & Lil Mama. Por que nem só do essencial vive o homem, e eu adoro a parte do “Oh In a second/I'll have you wrapped around my finger/Cause I can/Cause I can do it BETTER/There's no other…”