Boa moça fala sobre o que??????

Sou uma boa moça, sim, Maria Eugênia Figueredo é uma boa moça, criada para obedecer, calada e se possível sorridente. Minha mãe falou que era melhor ser assim, para poder casar, ter minha família e enfim ganhar o direito de ser uma mulher. Mas naquele lugar, não dava pra ser absolutamente nada, sei lá, talvez fossem as paredes tão brancas, a janela coberta com papel pra que o sol não entrasse, aquilo tudo deixava o ambiente claro, abafado eu diria impedido. Não podia fazer absolutamente nada, estava presa, a cama por pequenos canos que despejavam nas minhas veias, já cansadas, litros de vida entubada, envidrada, vida líquida da melhor qualidade como fazia questão de sempre afirmar Dr. Roberval, médico da família. Tudo para me curar, eu a pobre moça adoecida, com não sei o que, contraído de não sei quem. Não podia ficar sozinha, sempre havia alguém me olhando, verificando pressão, temperatura e tonalidade das unhas. E minha alma, quem cuidaria? Quem se preocuparia em perguntar como eu estava me sentindo por dentro, por dentro da alma. Quem? Então pra passar o tempo e pensar no tempo, resolvi brincar de fazer perguntas aos meus acompanhantes, coisas simples de se responder como: As suas conquistas são fruto do seu desejo ou da sua acomodação? Tu tens completa noção do que tu queres da vida e o que precisa fazer pra conseguir? A palavra amor tem algum sentido pra ti? E foi assim com o primeiro acompanhante, com o segundo, com o terceiro, até chegar o ponto de que ninguém mais queria ficar comigo. Descobri que as pessoas por dentro também ficam doentes de não sei o que, e que elas tem medo de perceber isso, por que pra essa doença não existe remédio da melhor qualidade entubado que pode ser despejado nas nossas veias por pequenos canos. Pra esse tipo de doença a cura não vem de fora, ela também está dentro.